quarta-feira, 17 de outubro de 2012


Era isso! O Pedro falou-me de Freud. Tinha sido aquele homem um dos primeiros interessados na matéria dos sonhos. Foi ele que fez o primeiro estudo sobre a interpretação dos sonhos, foi Freud que através da psicanálise interpretava os sonhos. Encontrei logo um bom motivo para me levantar da cama. Corri para o computador e fiz uma pesquisa sobre Freud e o seu método. Mas não encontrava nada daquilo que desejava. Então decidi ligar ao Pedro para ele me dar alguma informação, alguma dica sobre o tema. Queria mesmo perceber o método de Freud!
O Pedro ficou obviamente felicíssimo com o meu interesse! Recordou-me que apesar de estar de “férias” não devia descurar dos estudos e da aprendizagem e eu para o fazer um pouquinho mais feliz disse que era isso que pretendia fazer. Este tinha um livro de Freud que era o mais indicado para eu me iniciar, porque era aquele primeiro livro que me ajudaria a perceber o método mais específico. Atencioso como sempre, pediu-me a morada do local onde estava instalada para me enviar o livro. Expliquei-lhe que iria ter companhia por cá e que ele poderia mandar o livro pelo Luís e assim não gastaria dinheiro. Desligou-me o telemóvel praticamente na cara e passada cerca de uma hora (ai de mim que ele se apercebesse que eu adormeci naquele intervalo de espera) ligou-me a dizer que já tinha entregado o livro aos meus pais. Também tinha uma mensagem deles a dizer que o Luís e a Patrícia chegariam a casa na manha seguinte.
Teria mais um dia por minha conta. Finalmente, vi as horas: era quase uma e meia. Fiquei logo cheia de fome e teria ainda de ir comprar qualquer coisa para cozinhar pois a despensa estava completamente vazia.
Levantei-me e olhei mais uma vez lá para fora. Dali conseguia avistar a casa da Dona Olga. E ela tinha um pequeno mini mercado. Poderia ir lá ver se ele ainda existia, senão teria de ir procurar a outro lado.
Desci até à casa de banho para tomar um duche rápido e arranjei-me para sair. Comi uma barrinha de cereais que estava perdida na minha mala e parti à procura de um estabelecimento com algo que fosse possível cozinhar. 

quinta-feira, 11 de outubro de 2012


Acordei tarde, o sol já ia alto. Apercebi-me de que iria precisar de um relógio (de preferência despertador), pois estava completamente perdida no tempo, sem noção de horas e sem vontade nenhuma de as ir descobrir. A preguiça era tanta! Se o meu tutor, o Pedro, me visse, se imaginasse que eu ainda estava na cama, matava-me! Obrigava-me logo a tomar um duche de água fria e fazer uma vasta gama de exercícios. Lembro-me de que, por vezes, ele apanhava com o meu mau humor, tão cómico para ele, e que, quando a minha irmã decidia “aparecer”, ele ainda não era capaz de se sentir completamente à vontade comigo. Era como se aquilo o assustasse, como se tivesse medo que lhe fizesse algum mal. De início, incomodava-me aquela sua atitude pois sentia-me incomodada, tinha medo que ele me julgasse ou que corresse ao mundo dizendo que eu era uma aberração, mas com o passar do tempo ele foi-se habituando e eu apurei o meu sentido de humor em relação a este assunto e entrava na brincadeira: assustava-o, dizia que o ia amaldiçoar, entre outros. Resultou durante uns tempos, depois ele passou a conhecer-me melhor e a saber quando eu estava a fingir.
Senti uma repentina falta do Pedro. Afinal, ele era o único amigo que eu tinha. Em seis anos, o Pedro foi o meu único companheiro. Era ele que me ajudava em tudo, era ele que brincava comigo, foi ele que me deu a conhecer o mundo. Era como se fosse um irmão mais velho. Ai se ele estivesse a ler os meus pensamentos…ficava tão convencido que nunca mais ninguém o calava e eu nunca mais poderia resmungar pelas suas exigências porque afinal até gostava da forma de ensino dele. Ainda bem que a única “anormal” ali era eu!
Ri-me com esta afirmação. Fitei o quarto com os olhos à procura do meu telemóvel para consultar as horas. Lá estava ele: em cima da cómoda. Mas porquê ali?! Para consultar as horas teria de me levantar e de me arrastar praticamente para ver apenas as horas, só para saber se acordei muito tarde ou se já eram horas de fazer alguma coisa! Mas ainda não tinha fome, não tinha vontade de sair da cama…para quê fazer o sacrifício de sair daquele ninho confortável, se o meu corpo não o exigia?
É claro que naquela manha, não pensei desta forma, queria era mesmo ficar na cama. E foi o que fiz!
Pus-me de barriga para baixo e fiquei a observar através da vidraça o que se passava lá fora. Devido ao facto da cama ter um orifício que provavelmente teria a ver com a estética ou com a tendência da altura, era-me permitido observar tudo o que se passava lá fora, sem que ninguém desse por isso. E foi agradável ser por uns momentos uma coscuvilheira. Foi divertido poder observar as pessoas que em tempos me seguiam todos os paços, foi como que uma sensação de poder sobre elas, como se desta vez não era eu que me devia sentir incomodada mas sim aquelas pessoas que antes tão me infernizaram a vida e que agora estão mais velhas, e que não têm nada para observar. Gostei de ser a ‘má da fita’ uma vez…gostei de ser a verdadeira pessoa má! Porque antes eu poderia ser aos olhos dos outros um ser abominável, mas na realidade eles é que eram os verdadeiros maus…eram os outros que faziam mal! Foram os outros que estragaram a infância a uma menina que era apenas diferente ao protótipo que eles criaram na sua sociedade, foram eles que me tiraram toda a alegria e vontade de ser eu mesma! Foram eles!
Senti que a raiva começava a apoderar-se de mim e quando isso acontecia, o meu outro eu aparecia e revelava-se e isso ia estragar o meu disfarce. Por isso, tentei pensar rapidamente noutra coisa que me fizesse esquecer aquele assunto. Lembrei-me que tinha sonhado e que tinha sido um sonho mesmo muito estranho. Tentei lembrar o máximo daquele pesadelo tão invulgar. Escrevi o que me ia lembrando para não correr o risco de esquecer também o que me lembrava naquele momento. Tinha que descobrir o motivo daquele sonho. Tinha de descobrir qual o significado daquele sonho, qual o motivo da sua existência.